Um dos aspetos das teorias que ensino que mais rodas me dá à cabeça é que tenho de ter um entendimento mínimo da sua relevância, isto é, do que essas teorias estudam e da sua relação com o mundo, com outras teorias, conteúdos, etc. Sem este aspeto razoavelmente compreendido (ainda que sujeito a ilusões, erros, enganos, etc), parece-me que estou a militar no vazio. Depois de compreender para mim tenho de fazer um esforço ainda maior: ajudar os alunos a compreender. Muitas das vezes a maneira de ensinar ou partilhar o conhecimento de uma teoria é pedir para tentar avaliar os seus aspetos críticos. O que nem sempre é fácil. Eu não posso pedir aos alunos de 16 anos que me mostrem como a teoria de Popper é uma reação ao marxismo ou às teorias de Adler (a menos que passasse algumas horas a explicá-las, o que seria talvez proveitoso nem que fosse para mostrar que algumas teorias não precisam de ser científicas para serem boas teorias, como a própria teoria de Popper). Mas posso, por exemplo, perguntar como funciona o falsificacionismo à proposta do mestre africano Mamadu que está na Rua Fernão Ornelas a distribuir panfletos que dizem resolver os nossos problemas de dinheiro, amor e inveja e alega ser “cientista espiritual”. Ora, segundo o falsificacionismo será mesmo que o Mamadu diz a verdade quando se auto-intitula cientista? Também posso convidar os meus alunos a avaliar os pacotes de manteiga que dizem “Reduz o colesterol. Comprovado cientificamente”. Será que não deviam dizer antes: “Reduz o colesterol, ainda não falsificado pelos testes empíricos”. O que quero aqui expressar é que, penso, é ignorante que uma resposta se reduza a “ah, é a convenção”. Acho que muito raramente respondo assim aos meus alunos. E porquê? Porque se é uma convenção (e há, de facto, muitas) é-o por alguma razão. Pelo que “é uma convenção” é apenas uma maneira simples de muitos professores dizerem aos seus alunos qualquer coisa como "Olha, safa-te, decora essa coisa mesmo que não percebas, pois eu também não percebo”. Curiosamente também já ensinei algumas coisas deste modo: “Não faço bem ideia porque o filósofo X defende isto, penso que talvez tivesse em mente algo como Y, S ou R, mas mesmo assim não faço bem ideia, alguém é capaz de explicar?” Mas sempre que me comporto assim - e tenho a sorte de ter alunos curiosos - obtenho respostas mais interessantes do que aquelas que eu próprio fui capaz de esboçar, embora não tenham a eloquência das minhas, como de resto, é de esperar, pois eu sou mais velho e tenho mais conteúdos decorados J
E eis que nos preparamos para virar mais uma página no calendário anual da música. Podemos fazer listas de tudo, do ano, da década, do semestre. E eu faço mesmo listas de tudo. Mas o ano é um bom marco, talvez até porque a organização das nossas vidas se faz bastante bem de modo anual. E por isso confesso que começo a pensar nesta lista logo em Janeiro, isto para não deixar escapar algum disco para mim relevante, mas que se esqueceu por ter sido publicado nos primeiros meses do ano. Houve tempos em que eu publicava a lista dos melhores do ano. E agora? Acontece que é bastante injusto publicar uma lista dos melhores, até porque os discos que ouvi este ano podem não ser os melhores e muitos melhores terem-me passado ao lado. Por isso passei há uns anos a usar um critério: fazer a lista dos discos que de um modo ou de outro gostei e que foram os que mais companhia me fizeram, ou os que me soaram como mais ousados e criativos. Ocorre que ouço muitos discos que nem sequer aparecem na lista ...
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