Estudar filosofia pode proporcionar-nos uma experiência bastante interessante: diminuir a nossa resistência (psicológica, cultural, moral) a aceitar ideias diferentes. Ideias diferentes não são boas apenas porque são diferentes. Diria mesmo que em cada 100 ideias diferentes, 98 são francamente más. Mas o confronto com ideias diferentes é um permanente teste às nossas próprias crenças. Obviamente há ideias que se querem fazer passar por diferentes e novas e não o são (daí a elevada percentagem de ideias que são supostamente diferentes, mas são más). Eu gosto de testar ideias diferentes. No mundo empresarial, pensando em contextos como Silicon Valley, por exemplo, esta prerrogativa do teste e de fervilhar de ideias tem sido o motor das melhores ideias do mundo em termos comerciais. E é interessante perceber que muitas vezes o mundo das empresas e do comércio absorve melhor os ensinamentos das ditas humanidades do que muitos contextos do mundo cultural, artístico ou até filosófico. E existe uma relação estreita entre ideias diferentes e ensino, como o caso da Universidade de Stanford ( frequentada por Steve Jobs entre muitos outros). No coração da tecnologia mais avançada do mundo existe também um departamento de filosofia bastante avançado (tal como no MIT, por exemplo). Eventualmente estes contextos onde se “ensina” a lidar com a diferença também tem as suas fações mais conservadoras. Mas a diferença é o motor das novas ideias. E tal como Mill nos foi alertando, mesmo uma ideia aparentemente falsa pode conter uma centelha de verdade. Mas o conservadorismo faz com que se acuse sempre os outros que arriscam mais as ideias de “mania que tens a verdade”, “que sabes mais que os outros”, “queres sempre ter a razão”, etc... Por que razão, em termos de argumentação (deixando outros termos, como os psicológicos, de fora), este tipo de atitude (é mais uma atitude que um argumento) falha? Porque são maneiras de insultar e não de argumentar. Obviamente uma pessoa quando defende uma determinada crença tem, pois, a “mania” que a sua crença corresponde à verdade do mundo, senão não a defenderia. Mas quem o acusa de ter “sempre a mania da verdade” cai facilmente no erro que pretende evitar, que consiste em pressupor que a sua crença na “mania” do outro é verdadeira. E mesmo que da parte do outro apenas se trate de uma “mania”, será que não podemos ter verdades ou aproximações mais plausíveis à mesma e ter manias ao mesmo tempo? Dizer a alguém “tens a mania que tens sempre razão” é mais ou menos o mesmo que dizer “tens os olhos azuis por isso é que defendes isso”, isto porque ter a “mania” pode ser um defeito de caráter, mas no que respeita à procura da verdade tanto pode ser auxiliar como impedimento. Ou então teremos de assumir que alguns heróis respeitados pela memória não passavam de pessoas com manias, a começar por Sócrates, o filósofo grego.
1. Como chegamos hoje à música Há já alguns anos que os “discos do ano” deixaram de ser, necessariamente, os melhores discos do ano. Isso deve-se às novas formas de descoberta musical. Antes do streaming e da internet massificada, ouvia-se o que cabia numa casa comum de referências: a rádio, alguns jornalistas, amigos próximos. Havia filtros claros. Hoje o filtro é o algoritmo. E, embora nada tenha contra tecnologia, a verdade é que o algoritmo nunca acertou comigo. Já passei pelo Tidal, Spotify e, mais recentemente, Apple Music. Nenhum deles me levou aos discos que realmente acabei por mais apreciar. Continuo a chegar à música através de pesquisa intensa — por vezes quase desesperada — e graças a algumas amizades que resistem nesta troca de referências, como resistem ainda o Ípsilon e, sobretudo, a ultra-resiliente Wire. Este preâmbulo importa porque, como acontece todos os anos, no início de 2026 descobrirei excelentes discos de 2025 que ficaram de fora. O que vem a seguir é simplesm...

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